terça-feira, julho 20

Igreja de Nossa Senhora da Boa Morte

Datada de 1810, foi esta Igreja construída em terreno adquirido pela Irmandade dos homens pardos de Nossa Senhora da Boa Morte. Diz Paulo Cursino de Moura (São Paulo de outrora, p.60): “por cento e doze mil réis”. Na esquina da rua que vinha do quartel de voluntários reais. Situa-se, hoje, na rua do Carmo. Antiga rua da Boa Morte, em cuja esquina, junto à Tabatinguera, habitou o mestre Chico, dono da sapataria invidiata (invejada) e que tão folclórico foi naquelas bandas pelos fins do oitocentismo, segundo as lembranças de Miguel Milano no seu livro Os fantasmas da São Paulo antiga.


Boa Morte é o que os escravos pediam, subindo da atual Várzea do Glicério pela Tabatingüera, antes de serem enforcados no Largo da Forca, ali na Liberdade, junto à atual Igreja das Almas dos Enforcados. Seus parentes e amigos desciam, então, pela atual rua dos Estudantes e, na igrejinha dos aflitos pediam um bálsamo espiritual para a aflição de suas almas.


Esta igrejinha humilde tem algumas imagens de rara beleza. Beleza encarnada na simplicidade, sem o fausto e a riqueza dos grandes templos de antanho. Uma imagem do Cristo trazida do Pátio do Colégio, e que deve datar do século XVI, está lá, exsudando sua dor por todos os poros. Na entrada está o lendário Santo Expedito, santo mais daquela igreja popular que Antonio Gramsci, certamente, incluiria no senso comum do povo, do que da igreja oficial dos teólogos e estudiosos da história eclesiástica, naturalmente mais exigentes quanto à verdade histórica.
A Nossa Senhora das Dores, a das Lágrimas e da Assunção também ornam as paredes laterais da igreja. Contudo, chama a atenção a Nossa Senhora da Boa Morte ou do sono que espera a assunção de Maria (a Dormitio Mariae), cuja celebração se dá em 14 de agosto, um dia antes da Assunção.

A capela é pequena para os homens grandes de hoje, ricos e poderosos que não realizarão ali seus casamentos e outras exigências espirituais, como no passado. É igreja dos pequeninos. Ali realizam-se muitos batismos. Mas o porte do templo e seu irremediável sabor colonial, com suas paredes muito largas, não convidam às grandes cerimônias. Infiltrações de água, uma pintura descuidada nas paredes e em algumas imagens, que nada têm de originais, mas que também não podem ser restauradas sem a autorização do poder público, dificultam a reforma da igreja. Em 1984 houve uma pequena reforma no forro e em torno de outros detalhes. Insuficiente, como se pode ver.
A parte interna, cujo acesso foi permitido pelo amigo Padre Sergio Bradanini, tem uma ou outra imagem barroca, de pouco valor artístico. Mas um Cristo morto, que é usado na procissão da Semana Santa, esconde-se lá dentro. Partilhando as dependências da igrejinha, reúne-se a pastoral dos negros. Lá situa-se o quilombo central. O que faz dessa igreja da Boa Morte uma espécie de irmã da Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, lá no Largo do Paissandu.
A antiga Igreja de Nossa Senhora da Boa Morte é humilde. É a igreja mais pobrezinha do centro de São Paulo. Mas é forte. E bonita à sua maneira. Tão sem orgulho e sem vaidade que, às vezes, parece a única a lembrar que Jesus Cristo veio para os pobres e os humildes: “Bem aventurados vós, os pobres, porque vosso é o Reino de Deus” (Lucas, 6:20).


Fonte: www.partes.com.br

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